data-filename="retriever" style="width: 100%;">Em se tratando de grandezas matemáticas, meio milhão pode ser um número insignificante, se comparado a trilhões ou quatrilhões, por exemplo, mas é imenso, acachapante, dolorido, quando se trata de vidas humanas perdidas. E mais dolorido se torna quando tais perdas decorrem em boa parte da incúria, da inoperância, da incompetência, do mesquinho desapreço pela verdade, do negacionismo obtuso e obscurantista; quando decorrem da irresponsabilidade de quem deveria zelar por elas.
E mais duro e mais chocante se tornam essas centenas de milhares de vidas perdidas, muitas, a maioria talvez, de pessoas em plena atividade produtiva, com larga expectativa de vida, quando a irresponsabilidade escarnece da dor alheia; quando a irresponsabilidade tripudia sobre corpos defuntos que familiares e amigos sequer puderam velar em cumprimento do básico ritual milenarmente consagrado de trabalhar as perdas, a dor e o luto.
Quem dentre os senhores que me leem não teve uma perda, mais ou menos próxima - familiares, parentes, amigos, conhecidos - nestes últimos 15 meses em decorrência da Covid-19 ou não conhece alguém que precisou de baixa hospitalar e acabou entubado?
Quem não conhece alguém que, tendo passado por esse doloroso e marcante processo, sofre com sequelas físicas e psíquicas cuja extensão e gravidade poderão permanecer por tempo indeterminado?
E, creiam, há assustadoras previsões - tomara sejam equivocadas! - de que, quando setembro vier, talvez estejamos lamentando a morte de mais duzentos mil brasileiros, ou seja, nossos mortos em razão do coronavírus chegariam, em três meses, a 700 mil. Quem sabe, entre eles, eu, o senhor, o seu filho ou alguém próximo de nós.
Enquanto isso, o nosso presidente, desafiando a razão e o bom-senso, desdenhando da morte e do sofrimento alheios, andará, custeado pelo Erário, em alguma capital brasileira desfilando de moto sua arrogância, sua prepotência, orgulhoso de sua ignorância e do usual desrespeito pelos patrícios que o elegeram para comandar o país até o ano que vem, em flagrante e extemporânea campanha eleitoral.
Enquanto isso, o país, dependesse de políticas públicas, de planejamento e de ações aptas à reestruturação da economia e ao reordenamento das nossas múltiplas necessidades sociais, seguiria à deriva, qual transatlântico enorme e rico, mas com leme avariado e sem comando, em busca de um iceberg para nele se espatifar.
Por tais razões, como tenho feito usualmente, quero lembrar: ano que vem, teremos nova oportunidade de fazer opções que julgarmos as melhores para comandar nosso país. Isso é o bom da democracia, periodicamente podemos reavaliar nossos pontos de vista e fazer as escolhas que atendam nossas expectativas. Em nosso caso, expectativa de nos transformarmos num país socialmente mais justo e economicamente mais equilibrado. Não bastassem as dezenas de milhões de pobres e miseráveis, também devemos isso ao meio milhão de brasileiros vitimados pelo descaso com a Covid.